Erros meus, má fortuna, amor
ardente
Em minha perdição se
conjuraram;
Os erros e a fortuna
sobejaram,
Que para mim bastava o amor,
somente.
Tudo passei; mas tenho tão
presente
A grande dor das cousas que
passaram,
Que as magoadas iras me
ensinaram
A não querer já nunca ser
contente.
Errei todo o discurso de meus
anos;
Dei causa a que a Fortuna
castigasse
As minhas mal fundadas
esperanças.
De amor não vi senão breves
enganos…
Oh! Quem tanto pudesse que
fartasse
Este meu duro Génio de
vinganças!
Luís de Camões
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·
Soneto em decassílabo heróico.
·
Abba/abba/cde/cde
·
Ritmo ternário no 1.º verso
·
Lamento do sujeito por se
sentir alvo da conjura dos erros, da fortuna e do amor para o fazerem infeliz.
· Adjetivação – discurso valorativo
– acentua o pendor disfórico e hiperbólico do texto.
·
O corte mais profundo na
estrutura deste soneto passa entre o 1º e o 2.º terceto. Pode, assim,
distinguir-se um discurso autobiográfico (escrito na 1.ª pessoa, referente ao
passado) e dois versos exclamativos que exprimem um desejo relativo ao futuro).
·
Na 1.ª parte formam-se três
blocos de quatro versos.
1.ª quadra – tempo passado –
pretérito perfeito; presença de três vocábulos base: erros, fortuna, amor.
2.ª quadra – projeção do
passado no presente
1.º terceto e 1.º verso do
segundo terceto – tempo passado – regresso dos três vocábulos base (variante:
errei)
·
Ao longo de toda a primeira
parte existe uma rede de palavras - de
conotação negativa – que exprimem sentimentos: dor, magoadas iras, nunca ser
contente, mal fundadas esperanças, breves enganos. Constituem um vocabulário do
sofrimentos (perdição), relacionado com erros, Fortuna, Amor.
·
Este vocabulário é, assim,
completado por aquele que se encontra mais ligado a Fortuna (má, castigar) que
domina e transforma – fatalismo. As transformações que o Destino operou recaem
sobre a maneira de viver o amor que vai evoluindo ao longo do tempo:
1.º “do amor não vi senão
breves enganos”
2.º “não querer já nunca ser
contente”
·
A exclamação final
corresponde ao desejo de libertação desse Destino (má Fortuna). – A expressividade
da exclamação final fortemente acrescida pela consecutiva hiperbolizante.
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