sábado, 9 de fevereiro de 2013


Erros meus, má fortuna, amor ardente




Erros meus, má fortuna, amor ardente
Em minha perdição se conjuraram;
Os erros e a fortuna sobejaram,
Que para mim bastava o amor, somente.

Tudo passei; mas tenho tão presente
A grande dor das cousas que passaram,
Que as magoadas iras me ensinaram
A não querer já nunca ser contente.

Errei todo o discurso de meus anos;
Dei causa a que a Fortuna castigasse
As minhas mal fundadas esperanças.

De amor não vi senão breves enganos…
Oh! Quem tanto pudesse que fartasse
Este meu duro Génio de vinganças!

Luís de Camões
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·           Soneto em decassílabo heróico.
·           Abba/abba/cde/cde
·           Ritmo ternário no 1.º verso
·           Lamento do sujeito por se sentir alvo da conjura dos erros, da fortuna e do amor para o fazerem infeliz.
·   Adjetivação – discurso valorativo – acentua o pendor disfórico e hiperbólico do texto.
·           O corte mais profundo na estrutura deste soneto passa entre o 1º e o 2.º terceto. Pode, assim, distinguir-se um discurso autobiográfico (escrito na 1.ª pessoa, referente ao passado) e dois versos exclamativos que exprimem um desejo relativo ao futuro).
·           Na 1.ª parte formam-se três blocos de quatro versos.
1.ª quadra – tempo passado – pretérito perfeito; presença de três vocábulos base: erros, fortuna, amor.
2.ª quadra – projeção do passado no presente
1.º terceto e 1.º verso do segundo terceto – tempo passado – regresso dos três vocábulos base (variante: errei)
·           Ao longo de toda a primeira parte existe uma rede de palavras  - de conotação negativa – que exprimem sentimentos: dor, magoadas iras, nunca ser contente, mal fundadas esperanças, breves enganos. Constituem um vocabulário do sofrimentos (perdição), relacionado com erros, Fortuna, Amor.
·           Este vocabulário é, assim, completado por aquele que se encontra mais ligado a Fortuna (má, castigar) que domina e transforma – fatalismo. As transformações que o Destino operou recaem sobre a maneira de viver o amor que vai evoluindo ao longo do tempo:
1.º “do amor não vi senão breves enganos”
2.º “não querer já nunca ser contente”
·           A exclamação final corresponde ao desejo de libertação desse Destino (má Fortuna). – A expressividade da exclamação final fortemente acrescida pela consecutiva hiperbolizante.


OUVIR: http://ensina.rtp.pt/artigo/joao-reis-le-luis-vaz-de-camoes/




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